CHAVES NETO, Elias (São Paulo, 1899 – Rio de Janeiro, 11/06/1981).
Provinha de família tradicional da elite paulista, os Prado Chaves, proprietários da maior empresa de comercialização do café. Fez seus estudos secundários no Colégio Cantonal de Lausanne, na Suíça, e graduou-se em Direito na Faculdade de Direito do Largo São Francisco no ano de 1923.
Durante a Revolução Paulista de 1924, deflagrada em 5 de julho, teve sua prisão decretada pelo então Presidente do Estado de São Paulo, Carlos de Campos, sob a alegação de que seu irmão, Capitão Pacheco Chaves, oficial do exército, havia bombardeado o palácio do governo. Curiosamente ficou preso no porão, que era a antiga sala de ginástica e duchas, onde brincara quando criança, da casa de seu avô, o Palacete Elias Chaves, transformado em Palácio dos Campos Elíseos, antiga sede do governo paulista.
Entre 1927 e 1935, foi advogado do Departamento Legal das Empresas Elétricas, uma subsidiária da Electric Bond and Share Company, o grande truste norte-americano de eletricidade, que lhe permite desvendar o funcionamento de uma grande empresa de serviços públicos atuando no Brasil, antes e depois da revolução e 1930. Elias pode observar de dentro da empresa a transição do capital inglês para o americano, seus métodos, sua fundamentação ideológica. Sempre fiel a seus princípios, tentava acomodar os interesses de sua Companhia ora com as reivindicações dos revoltosos ora com as dos situacionistas. Viveu no Eixo Rio de Janeiro – Recife enquanto funcionário da Companhia, vindo a se restabelecer em São Paulo para abrir seu escritório de advocacia. Foi testemunha do assassinato de João Pessoa em 1930, na Confeitaria Glória no Recife.
Segue cursos na recém fundada Universidade de São Paulo quando o marxismo lhe aparece como uma revelação contribuindo para contestar seu trabalho nas Empresas Elétricas Brasileiras, que logo abandona, decisão que credita ao livro de Georges Friedmann, A Crise do Progresso, por ter-lhe “retirado a catarata dos seus olhos”. Sua iniciação ao marxismo se deveu ao então jovem professor Jean Maugué, no bacharelado de filosofia da USP, de 1935 até 1940. Elias é um dos alunos retratados no livro de memórias de Maugué, Les Dents Agacées (Buchet-Chastel, 1982). Em 1935, Elias forma-se em filosofia pela Universidade de São Paulo.
O advogado transforma-se em jornalista e intelectual militante do Partido Comunista do Brasil, sempre presente nas principais greves e manifestações ligadas ao setor dos intelectuais. Apesar de seu diploma da filosofia da USP, insistia em ser considerado fundamentalmente como jornalista. Foi correspondente do Correio da Manhã no Rio de Janeiro, redator da Folha da Manhã, de A Noite e do Popular em São Paulo, e diretor da Agência Meridional, dos Diários Associados.
Foi preso em meados de 1945 juntamente com alguns dirigentes políticos, entre eles Caio Prado Júnior e Jorge Amado, por ter ido à sede do Movimento Unificado dos Trabalhadores na qualidade de jornalista para colher informações, tendo sido libertado no dia seguinte.
Seus textos foram citados por Luís Carlos Prestes em comício histórico ocorrido no estádio do São Januário no Rio de Janeiro em maio de 1945 e participou ativamente na organização do comício de Prestes na Cidade de São Paulo que ocorreu no estádio do Pacaembu em julho de 1945.
Por ocasião da cassação dos mandatos dos deputados do PCB em 1948, Elias foi colher assinaturas para um abaixo-assinado contra essa cassação entre o pessoal do jornal O Estado de S. Paulo.
Sua demissão de O Estado de S. Paulo, por sustentar uma posição favorável ao aumento dos salários dos gráficos e redatores, provocou em 1948 uma das raras greves na história do matutino que ficou conhecido como o “assalto comunista”.
Ainda em 1948, por conta da publicação de um manifesto de dirigentes do PCB no Popular, do qual era diretor, foi proibida a circulação de tal jornal. Elias Chaves Neto, inconformado, se dirigiu ao DOPS para protestar contra tal fato e foi preso em 1948, por 60 dias, recluso em um batalhão da Força Pública, juntamente com os dirigentes do Partido Comunista do Brasil. Mesmo com toda a oposição ao governo, o Popular voltou a circular.
Permaneceu preso por aproximadamente seis meses em meados de 1952 por haver publicado um artigo do Hoje, segundo o qual a convocação de reservistas não era para a execução de manobras, mas sim para o envio de contingente à Guerra da Coréia em 1950.
Depois do encerramento, em 1955, de Fundamentos, estreita-se o espaço para a expressão de idéias comunistas. Elias, juntamente com outros intelectuais e militantes comunistas, como seu primo Caio Prado Júnior, David Rosemberg, Carlo Tamagni, Paulo Alves Pinto, Salomão Schattan, Álvaro de Faria, Gastão Rachou e Roger Weiller, funda um grupo de discussões que dá origem à Revista Brasiliense, cuja publicação se inicia em setembro de 1955 e teve 51 volumes publicados bimestralmente por 9 anos sem qualquer interrupção. Elias foi diretor da Revista Brasiliense por todo esse período, de 1955 a 1964, onde publicava análises de conjuntura que acarretavam repercussões decisivas no debate da época. Deve ser levado em conta que seus estudos se situam numa conjuntura crucial tanto para a história política no Brasil como do PCB. As questões discutidas – nacionalismo, democracia e socialismo – não são apenas análises teóricas de um intelectual, mas exercícios de análise de análise de um militante comunista, que ele não escamoteia até sua morte.
O surgimento da Revista Brasiliense representou o nascimento de uma publicação independente no campo da esquerda comunista, principalmente na medida em que rompia com o controle material do PCB. Publicada pela Editora Brasiliense, de propriedade do historiador e editor paulistano Caio Prado Júnior, o primo Caio, como o chamava Elias com grande respeito, a revista beneficiou-se do fato de não precisar de recursos provenientes de anúncios comerciais ou da chancela do Partido Comunista, sobrevivendo com recursos próprios. Entre seus colaborados estavam intelectuais de diversas tendências ideológicas do centro a esquerda, abrigando colaborações até mesmo de figuras históricas do PCB que ao longo de sua trajetória tiveram graves problemas com a direção do partido, como Octavio Brandão e Heitor Ferreira Lima.
Obra
Publicou suas memórias em Minha Vida e as Lutas de Meu Tempo (Editora Alfa Ômega, São Paulo, 1977). No relato sobre os começos de seu trabalho como advogado na concessionária americana de serviços públicos mostra as relações conflitantes entre o governo provisório de 1930 e as empresas concessionárias, tanto no que diz respeito à política de investimento da matriz, como os primeiros confrontos com a implementação da legislação trabalhistas. A descrição das greves em Recife em Maceió fornece novos dados sobre o movimento operário na região e para a reconstrução dos levantes comunistas no Nordeste. Há flashes sobre protagonistas do período, como os tenentes no Nordeste, contribuindo para uma visão mais complexa ali das diretrizes do movimento de 1930. Na Revista Brasiliense, da qual foi diretor entre 1955 e 1964, publicou, entre outros, os seguintes artigos: “Política de União Nacional” (Revista Brasiliense, nº 1, jan/fev, 1955), “Brasília” (Revista Brasiliense, nº 29, mai/jun, 1960), “Cuba, no III aniversário da Revolução” (Revista Brasiliense, nº 39, set/out, 1962) e “Paz para Cuba” (Revista Brasiliense, nº 45, jan/fev, 1963). Após sua morte, foi feita uma compilação de alguns de seus artigos em o Sentido Dinâmico da Democracia (Editora Brasiliense, São Paulo, 1982).
Cómo citar esta entrada: Pinheiro, Paulo Sérgio e Dias, Rafael Felice (2019), “Chaves Neto, Elias”, en Diccionario biográfico de las izquierdas latinoamericanas. Disponible en https://diccionario.cedinci.org