DIAS, Everardo (Pontevedra, España, 1883 – São Paulo, Brasil, 7/3/1966).
Periodista y tipógrafo de origen español vinculado a los principales movimientos sociales del primer tercio del siglo XX, especialmente en São Paulo. Participó activamente en las famosas huelgas de 1917 y 1919 de esa ciudad. Masón y militante anticlerical, fue compañero de ruta de los anarquistas. Escribió en órganos de la prensa obrera, formó parte del grupo fundador de la edición carioca de la revista Clarté y participó en la campaña derrotada de Nilo Peçanha para la Presidencia de la República. Miembro del Partido Comunista de Brasil (PCB) y candidato derrotado al Consejo Municipal de São Paulo por el Bloque Obrero y Campesino (BOC), apoyado por el Partido en la clandestinidad. Publicó obras de enorme valor por su registro de las luchas sociales y su represión en Brasil.
Jornalista e tipógrafo de origem espanhola ligado aos principais movimentos sociais no primeiro terço do século XX, especialmente em São Paulo. Atuou nas célebres greves de 1917 e de 1919. Maçom, militante anticlerical, foi companheiro de viagem dos anarquistas. Escreveu para órgãos da imprensa operária, integrou o grupo fundador da revista Clarté e fez parte da campanha derrotada de Nilo Peçanha à Presidência da República. Membro do Partido Comunista do Brasil (PCB) e candidato derrotado ao Conselho Municipal de São Paulo pelo Bloco Operário e Camponês (BOC), apoiado pelo Partido na clandestinidade. Publicou obras de enorme valia pelo registro das lutas sociais e da repressão a elas em Brasil.
Everardo Dias nasceu em Pontevedra, na Espanha, em 1883. Três anos depois, por motivos políticos, sua família mudou-se para o Brasil, estabelecendo-se em São Paulo. Era filho de Genoveva Alvares e Antonio Dias, um tipógrafo republicano, anarquista, maçom e revolucionário. Ainda jovem, Everardo trabalhou como tipógrafo-caixista no jornal O Estado de São Paulo. O menino fora alfabetizado pelos pais e mais tarde estudou na Escola Normal da Praça da República, que era a única escola pública de segundo grau na cidade de São Paulo. Depois de formado, em 1904, Everardo foi nomeado professor em Aparecida do Monte Alto, no interior do estado de São Paulo. Logo desistiu da carreira e voltou à capital, onde trabalhou como jornalista e tipógrafo. Já pertencia à maçonaria, onde atuou durante quase toda a vida adulta (Castellani, s/d).
A partir de 1903, por mais de dez anos, Dias dirigiu o jornal O Livre Pensador, caracterizado por defender a liberdade religiosa e de imprensa, em nome da razão contra o conservadorismo da Igreja católica. Adotava os lemas moral-progresso-verdade, liberdade-igualdade-fraternidade e ciência-justiça-trabalho. O jornal de Everardo Dias acompanhou a ascensão do movimento operário de seu tempo, conduzido sobretudo por operários imigrantes em São Paulo, que se industrializava com a riqueza acumulada pelos cafeicultores. Um de seus escritos difundidos na época foi “Jesus Cristo era anarquista”, publicado em 1920 pelo grupo do jornal A Plebe, do qual foi colaborador, embora tenha sido muito mais um livre pensador do que anarquista. Redigiu o célebre “Manifesto aos soldados”, convocando-os a aderir à greve geral de 1917 em São Paulo. A atuação de Dias teria sido ainda mais expressiva na greve de 1919, que o levou a ser preso e castigado com 25 chibatadas, como relatou seu amigo e líder anarquista Edgard Leuenroth (1962). Acabou sendo deportado com outros grevistas nascidos no exterior.
A história dessa prisão foi contada no livro Memórias de um exilado, publicado por Everardo Dias em 1920. Ele foi o único dentre os expulsos do país a conseguir o perdão presidencial, graças às relações com ilustres maçons republicanos, como o deputado federal Maurício de Lacerda, que liderou a campanha contra a deportação com apoio da maçonaria, de alguns parlamentares e integrantes do movimento operário. Essa obra memorialística precoce narra a agitação social no final da década de 1910, sobretudo em São Paulo e Recife, onde Dias foi recebido com festas ao desembarcar do navio que o levara para o exílio e o trazia de volta após o perdão do presidente Epitácio Pessoa. Testemunha também as péssimas condições carcerárias impostas aos grevistas de 1919, submetidos a todo tipo de arbitrariedade do governo brasileiro. A obra permite ainda notar a mobilização de uma intelectualidade crítica em formação no Brasil, que era contestadora da ordem estabelecida e ao mesmo tempo buscava mecanismos de afirmação social e política por meio da imprensa, da militância política ou da maçonaria.
Esse livro também evidencia o impacto no Brasil do fim da primeira Guerra Mundial e em especial da revolução russa. Esta foi importante para aglutinar descontentes com o governo, de diversas origens sociais, alguns dos quais viriam a fundar o Partido Comunista do Brasil (PCB) em 1922. Futuros comunista históricos são personagens do livro, como Christiano Cordeiro, João Pimenta, Antonio Canellas e Astrojildo Pereira, que viria a desposar Ignês, a filha mais velha de Everardo Dias.
Dias estabeleceu-se numa chácara no bairro do Meyer, no Rio de Janeiro, ao retornar da breve viagem de exílio interrompido. Lá montou uma gráfica, ligada à maçonaria, onde imprimiu os livros Delenda Roma! e Semeando, ambos de 1921, com suas conferências anticlericais. Ajudou a fundar a revista Clarté em janeiro daquele ano, com Nicanor Nascimento, Evaristo de Moraes, Maurício de Lacerda, Luiz Palmeira e outros bacharéis (Silva, 2016). Inspiraram-se no grupo liderado por Henri Barbusse em Paris, simpático à revolução soviética. Everardo Dias, autor do artigo “A propósito de greves” (1921c), foi dos raros integrantes da revista que se tornou comunista. Outros viriam a ocupar altos cargos no Ministério do Trabalho do governo de Getúlio Vargas; a tendência predominante no grupo era favorável a reformas graduais.
Everardo Dias participou da campanha de Nilo Peçanha à Presidência da República em 1922. Seu candidato era republicano, maçom e liberal. Congregava os adversários de Arthur Bernardes, apoiado pelas oligarquias dominantes à sucessão de Epitácio Pessoa. Dias participou de várias conspirações após a derrota de Peçanha, chegou até a ser preso por um breve período em abril de 1923. O levante militar de São Paulo, em julho de 1924, contou com a adesão de Everardo. Logo depois ele participou da conspiração do almirante Protógenes Guimarães no Rio de Janeiro, que o levou à cadeia em agosto de 1924. Só foi libertado mais de dois anos depois, com o fim do estado de sítio que vigorou durante o governo de Arthur Bernardes.
A obra mais expressiva de Everardo Dias, Bastilhas modernas (1927a), conta essa experiência nas prisões: Polícia Central, Detenção, Ilha Rasa, Ilha das Flores, Presídio do Bom Jesus e Casa de Correção. A partir de testemunhos de companheiros, registrou também as tragédias dos cárceres nos quais não esteve, como Ilha das Cobras, Ilha da Trindade, o navio Campos, e especialmente o campo de Clevelândia, localizado no Oiapoque, no extremo norte do Brasil, conhecido como inferno verde. Lá, centenas de prisioneiros foram dizimados pelas doenças, má alimentação e falta de cuidados médicos. (Pinheiro, 1991; Samis, 2002). Documento histórico, a obra registra em detalhe o aparelho de repressão da ordem oligárquica contra seus inimigos sociais e políticos.
Ao sair da cadeia, Everardo retornou a São Paulo para viver com a família e ajudar a organizar o Partido Comunista, ao qual aderira pouco antes de ser preso. Em cartas endereçadas ao secretário geral Astrojildo Pereira, expressou sua dedicação ao Partido e ao jornal comunista A Nação no breve período de legalidade do Partido, de 3 de janeiro a 11 de agosto de 1927. Elas revelavam a inserção pouco expressiva dos comunistas na classe operária paulista, bem como as dificuldades materiais dos militantes, que entretanto mantinham ânimo para mobilizar o operariado (Dias, 1927b). Ele se afastara da maçonaria quando aderiu ao comunismo. Contundo, mantinha antigas amizades nos meios anticlericais, com os quais buscava fundos para ajudar a manter A Nação. O jornal logo seria fechado, assim como outros órgãos da imprensa operária, após a entrada em vigor de legislação repressiva aprovada pelo Congresso em agosto de 1927, particularmente o decreto 5.221, a principal entre as chamadas “leis celeradas” que institucionalizavam a punição aos opositores, até mesmo a deportação dos indesejáveis.
Nas eleições de outubro de 1928 para o Conselho Municipal de São Paulo, Everardo Dias foi candidato derrotado. Apesar de todos os problemas – como a clandestinidade forçada, as fraudes eleitorais, a coerção policial, as restrições eleitorais para os pobres e o voto de cabresto nas áreas de influência do coronelismo –, o PCB participou das eleições por meio do Bloco Operário e Camponês (BOC), uma organização política de “frente única” para fazer propaganda, denúncia e agitação política (Karepovs, 2006). O BOC de Everardo teve votação pouco expressiva na capital paulista, mas elegeu Octavio Brandão e Minervino de Oliveira para o Conselho Municipal do Rio de Janeiro.
A Aliança Liberal e a chamada revolução de 1930 contaram com o apoio crítico de Everardo Dias. Ele elaborara, com Maurício de Lacerda, um programa da Frente Unida das Esquerdas, em março de 1929. A seguir, conspirou com o líder militar Siqueira Campos, cujos planos para iniciar a revolução foram abortados após sua morte num desastre aéreo em maio de 1930. No começo daquela década, Dias foi expulso do PCB, formalmente desligado em 1932, numa onda de obreirismo que levou ao expurgo de intelectuais e não poupou sequer o secretário-geral Astrojildo Pereira.
A rebelião paulista fracassada de 1932 contou com a atuação de Everardo Dias, que expressou assim seu descontentamento com os rumos do governo Vargas. Na ocasião, trabalhava na redação do Diário Nacional, jornal do Partido Democrático, com o qual tinha relações desde o final dos anos de 1920. Mais adiante, foi preso de 30 de novembro de 1935 a 27 de fevereiro de 1937, acusado de cumplicidade com o levante comunista – do qual efetivamente não participou. Depois de libertado, estreitou a velha ligação com a maçonaria, à qual se dedicou até morrer em 1966, embora não tivesse abandonado as convicções socialistas.
Na década de 1950, Dias foi colaborador frequente da Revista Brasiliense, de Caio Prado Jr, Elias Chaves Neto e outros comunistas, cujas propostas eram marginais no PCB. Seus artigos na revista foram reunidos em seu livro mais conhecido atualmente, intitulado História das lutas sociais no Brasil, editado em 1962 e republicado em 1977. Trata-se de uma narrativa baseada nas memórias de sua experiência de vida em meio às agitações sociais do primeiro terço do século XX. O próprio autor afirmou que –embora fosse adepto do marxismo e de sua explicação complexa das lutas de classes– não pretendeu com a obra usar esse método, mas apenas relatar os acontecimentos (Dias, 1977, p.126).
Everardo Dias teve seis filhas com Maria Ribeiro Dias, dona de uma pensão em São Paulo, cujos clientes eram sobretudo estudantes da Faculdade de Direito do Largo São Francisco. Teve com ela mais quatro filhos homens, falecidos ainda bebês. Ficou viúvo em 1932. A partir de então, as filhas ainda menores foram viver no Rio de Janeiro com a irmã mais velha, Ignês, já casada com Astrojildo Pereira, conforme relato de Beatriz Alcofarado (2012), uma de seus seis netos. Dias passou a morar com Tereza, sua companheira até a morte. Viveu seus últimos anos numa chácara na zona leste paulistana. Em 1963, no contexto de agitação social que culminaria com o golpe militar de 1964, um espião do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) deu sua contribuição ao longo prontuário de Everardo. Corroborava o parecer de um colega, escrito cerca de 20 anos antes, que resumia sua vida aos olhos dos agentes repressivos:
Anarquista. Comunista. Tem tido contínuo contato com a polícia, por efeito de suas ideias avançadas a cuja propaganda tem se dedicado com muito carinho. Tem prestado sua atividade intelectual a uma intensa propaganda comunista. […] Seus discursos sempre foram contra os poderes constituídos. […] É um propagandista ativo e perigoso.
(Prontuário n. 136 do DOPS-SP, referente a Everardo Dias).
Everardo Dias morreu em São Paulo em 1966. É hoje o nome de uma rua no bairro do Limão e de uma loja maçônica na zona oeste da cidade.
Obra
Bibliográfica
- Jesus Cristo era anarquista. São Paulo: A Plebe, 1920a.
- Memórias de um exilado (episódios de uma deportação). São Paulo: s.d., 1920b.
- Delenda Roma! Conferências anticlericais. Rio de Janeiro: Oficina Gráfica da Escola Profissional Maçônica José Bonifácio, 1921a.
- Semeando: palestras e conferências. Rio de Janeiro: Oficina Gráfica da Escola Profissional Maçônica José Bonifácio, 1921b.
- Bastilhas Modernas. São Paulo: Empresa editora de obras sociais e literárias. s/d [1927a].
- História das lutas sociais no Brasil. São Paulo: Edaglit, 1962. [2.ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1977.]
Hemerográfica
- “A propósito de greves”. Clarté, Revista de Ciências Sociais 6 (Rio de Janeiro, dez. 1921c): 73.
Cómo citar esta entrada: Ridenti, Marcelo (2022), “Dias, Everardo”, en Diccionario biográfico de las izquierdas latinoamericanas. Disponible en https://diccionario.cedinci.org.