DA SILVA PRADO, Caio (São Paulo, Brasil 1907 – 1990).
Advogado, historiador, editor marxista brasileiro. Membro do Partido Comunista do Brasil até sua morte em 1990.
Herdeiro de uma das mais ricas famílias paulistas de fazendeiros e senhores de escravos, Caio Prado Júnior foi educado em casa e, depois, na Inglaterra. Fez muitas viagens ao longo da vida por diferentes países do mundo e no interior do Brasil, incluindo pesquisas de campo com geógrafos franceses da Universidade de São Paulo (USP). Como a maioria dos filhos da sua classe social estudou na Faculdade de Direito de São Paulo (1924-1928). Era filho de Caio Da Silva Prado e Antonieta Álvares Penteado.
Em aderiu ao Partido Democrático em 1928, uma dissidência oligárquica do partido republicano paulista dirigida pelo seu avô, Conselheiro Antônio Prado. Participou na Revolução de 1930 e foi um dos delegados revolucionários no interior do estado de São Paulo. Ele se casou com Hermínia Cerquilho no tradicional Mosteiro de São Bento em 1931, ano em que nasceu seu seu filho Caio Graco, que mais tarde conduzirá a Editora Brasiliense. Naquele ano uma rotação política mudou sua trajetória. Ele ingressou no Partido Comunista do Brasil (PCB).
Em 1933 publicou Evolução política do Brasil em que elaborou uma síntese da história brasileira da colônia ao fim do Império tendo por base o materialismo dialético. Naquele mesmo ano viajou à União Soviética. Ao voltar proferiu palestras muito concorridas no Clube dos Artistas Modernos (CAM), do qual era membro fundador. Em 1934 publicou o livro URSS, um novo mundo.
Sua condição de comunista e filho da “aristocracia paulista” marcou permanentemente a sua imagem pública. Caio Prado Júnior foi o modelo para uma personagem do romance Subterrâneos da Liberdade do escritor Jorge Amado. Ele foi retratado como indeciso (devido à sua origem de classe) e, junto com o vilão trotskista inspirado em Hermínio Sacchetta, cultivava a obra “degenerada” de uma pintora modernista (provavelmente Tarsila do Amaral, com quem Caio Prado Júnior conviveu no Clube dos Artistas Modernos). Claude Lévi-Strauss descreveu Caio Prado Júnior como o comunista que era o rico herdeiro do feudalismo local.
Lévi-Strauss o conheceu na USP, fundada em 1934. Caio Prado Júnior fez parte da primeira turma de alunos da seção de História e Geografia. Entre seus professores estavam Jean Maugè, Pierre Monbeig, Pierre Deffontaines e Fernand Braudel que anos depois escreveu uma resenha crítica de sua obra historiográfica.
Paralelamente, intensificava sua militância comunista. Levantou fundos financeiros para o socorro vermelho, foi secretário fundador da Associação dos Geógrafos do Brasil, manteve polêmicas por correspondência com Livio Xavier, um dos principais trotskistas do período e com as instâncias do PCB.
Em 1935 dirigiu a seção paulista da Aliança Nacional Libertadora (ANL), embora o presidente regional honorário fosse o General Miguel Costa. A ANL era uma frente política que reunia comunistas, socialistas e a ala esquerda do tenentismo, a partir de uma plataforma de combate ao fascismo e ao imperialismo. Após o fracasso do levante promovido por setores da ANL em Natal, Recife e Rio de Janeiro, em 1935, Caio Prado esteve preso por dois anos. Partiu para o exílio em 1937. Viajou pela Europa e se fixou na França, onde atuou no auxílio aos republicanos na fronteira com a Espanha. Regressou ao Brasil em 1939.
Caio Prado casou-se em segundas núpcias com Helena Nioac, uma filha de fazendeiros como ele. Dedicou-se a pesquisas históricas e, em 1942, publicou sua obra mais importante: Formação do Brasil Contemporâneo. No ano seguinte, ele se tornou empresário do ramo editorial e co fundador da editora Brasiliense, juntamente com José Bento Monteiro Lobato, Arthur Neves (editor vinculado ao PCB) e a escritora Maria José Dupré.
O partido havia deixado de existir por volta de 1941. Núcleos em diferentes partes do Brasil se articularam e reclamaram para si a continuidade do PCB. A corrente que predominou teve o apoio de Luiz Carlos Prestes.
Caio Prado Júnior pertencia aos comitês de ação de São Paulo juntamente com Tito Batini, Heitor Ferreira Lima e outros militantes comunistas.
Tinha outra visão da política nacional e era contrário à aproximação do PCB com Getúlio Vargas. Mesmo assim, aceitou a vitória da corrente dominante e, ao contrário de muitos de seus camaradas dos Comitês de Ação, permaneceu no partido.
Em 1947 foi eleito deputado estadual constituinte em São Paulo pelo PCB. Na Assembleia, ao lado de Mario Schemberg, foi um dos principais responsáveis pela aprovação de uma lei que mais tarde instituiu a Fundação de amparo à pesquisa do estado de São Paulo (Fapesp). Com a cassação do registro do partido em 1948, ele perdeu o mandato. Em seguida foi preso por três meses e, depois, partiu em viagem ao Leste Europeu.
Na década de 1950 publicou livros sobre teoria econômica e filosofia. O mais importante deles foi Dialética do conhecimento que recebeu o prêmio do Instituto Brasileiro de Filosofia em 1952. O livro teve repercussão e uma acolhida polêmica nos jornais, mas não foi difundida pelo aparato editorial e jornalístico do PCB. Astrojildo Pereira, numa extensa crítica (que não foi publicada) disse que a obra de Caio Prado era um “revisionismo antimarxista”. O editor comunista Calvino Filho também considerava Caio Prado revisionista. No campo da historiografia ele também era atacado pelos dirigentes comunistas que preferiam a tese da existência do feudalismo no Brasil e a obra do historiador Nelson Werneck Sodré. Desde 1932 Caio Prado Junior declarava que “nas condições do Brasil não há lugar para uma revolução burguesa, porque o nosso regimen já é aqui burguês”. Para ele a burguesia sempre comandara o sistema produtivo, fossem os fazendeiros ou os industriais.
A aproximação do PCB com os governos desenvolvimentistas de Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek e João Goulart fez com que Caio Prado Junior se tornasse mais crítico. Nos debates que antecederam o V Congresso do PCB em 1960, ele defendeu que não se podia contar com a burguesia brasileira como força propulsora da revolução agrária e nacional. Ele não propunha a socialização imediata dos meios de produção mas negava que o desenvolvimento capitalista no Brasil tivesse um caráter progressista.
Em 1962 Caio Prado Júnior assumiu a chefia da liderança da editora Brasiliense com a saída de Artur Neves, que foi chefiar a Editora da Universidade de Brasília. Ele dividiu seu tempo entre viagens, artigos sobre a questão agrária e os negócios. Em 1966 publicou A Revolução Brasileira e recebeu o título de intelectual do ano da União Brasileira de escritores. Era uma resposta intelectual ao golpe de estado de 1964 e uma crítica à estratégia do PCB. Foi traduzida imediatamente para o espanhol e lançada na Argentina com tradução e prefácio de Rodolfo Puiggrós (sob o pseudônimo “Céspede”), que escreveu ao autor reconhecendo no livro uma posição criativa no seio do marxismo. Caio Prado Junior mantinha contatos com intelectuais de muitos países, mas principalmente argentinos como Norberto Frontini, Ángel Rama, Sergio Bagú e Héctor Agosti (que também se correspondeu com Astrojildo Pereira). Notam-se semelhanças historiográficas entre sua obra e a de Milcíades Peña que o cita indiretamente através da obra de Bagú.
Ele considerava errada a pergunta: nossa revolução será socialista ou democrático burguesa? Para ele o simples conceito da revolução brasileira só poderá ser extraído dos fatos que a constituem, uma vez “fixadas as reformas e transformações cabíveis e que se verificarão no curso da mesma revolução”. Ele não fazia definições categóricas. Preferia expor movimentos, processos e relações e, por isso, foi muitas vezes acusado de não ser marxista ou desconhecer conceitos de Marx.
Durante a ditadura militar ele não manteve uma atividade militante clandestina. Apesar disso, foi preso em 1970 e absolvido no ano seguinte. Em 1975 uniu-se a Maria Cecília Naclério Homem e foi substituído pelo seu filho Caio Graco na chefia da editora Brasiliense. Continuou atualizando suas obras, escreveu alguns livros e artigos e deu entrevistas. No fim de 1983 apareceu publicamente pela última vez, num comício da campanha pelas eleições diretas. No ano seguinte adoeceu gravemente e faleceu em São Paulo em 1990.
Obras
- Evolução Política do Brasil: ensaio de interpretação materialista da história brasileira, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1933.
- URSS – Um Novo Mundo, São Paulo, Companhia Editora Nacional,1934.
- Formação do Brasil Contemporâneo, São Paulo, Martins, 1942.
- História Econômica do Brasil, São Paulo, Brasiliense, 1945.
- Evolução Política do Brasil: Ensaio de Interpretação Dialética da História Brasileira, São Paulo, Brasiliense, 1947.
- Dialética do Conhecimento, São Paulo, Brasiliense, 1952.
- Evolução Política do Brasil e Outros Estudos, São Paulo, Brasiliense, 1953.
- Introdução à Lógica Dialética (Notas Introdutórias), São Paulo, Brasiliense, 1959.
- Diretrizes para uma Política Econômica Brasileira, São Paulo, Urupês, 1954.
- Esboço dos Fundamentos da Teoria Econômica, São Paulo, Brasiliense, 1957.
- O Mundo do Socialismo, São Paulo, Brasiliense, 1962.
- Evolución Politica del Brasil y Otros Estudios, Montevideo, Palestra, 1964.
- A Revolução Brasileira, São Paulo, Brasiliense, 1966.
- La Revolucion Brasileña, Buenos Aires, Peña Lillo, 1968.
- The Colonial Background of Modern Brazil, Berkeley, University of California press, 1969.
- Estruturalismo de Lévi-Strauss – O Marxismo de Louis Althusser, São Paulo, Brasiliense, 1971.
- História e Desenvolvimento, São Paulo, Brasiliense, 1972.
- A Questão Agrária no Brasil, São Paulo, Brasiliense, 1979.
- O que é Liberdade, São Paulo, Brasiliense, 1980.
- O que é Filosofia, São Paulo, Brasiliense, 1981.
- A Cidade de São Paulo: Geografia e História, São Paulo, Brasiliense, 1983.
Tradução
Bukharin, N. Tratado do Materialismo Histórico. Sociologia popular marxista. 4 volumes. São Paulo: Caramuru, 1935. [Sem o nome do tradutor na edição. O historiador Edgard Carone atribuiu a Caio Prado Júnior a tradução].
Cómo citar esta entrada: SECCO, Lincoln (2020), “Prado Júnior, Caio”, en Diccionario biográfico de las izquierdas latinoamericanas. Disponible en https://diccionario.cedinci.org